Como vai a família em São Paulo?

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14/08/2019 - 10:30

A passagem do Dia dos Pais nos traz de volta à reflexão sobre a família. Desejo fazer aqui uma reflexão sobre a situação das famílias católicas na arquidiocese de São Paulo, baseada na ampla pesquisa de campo realizada em 2018, em vista do 1º sínodo arquidiocesano, que está sendo realizado em São Paulo. De maneira geral, observa-se que também por aqui a família continua sob forte pressão, atingida, sobretudo, pelas mudanças culturais e pelas circunstâncias econômicas. Mesmo assim, ela ainda tem alta consideração positiva e 91% dos entrevistados na pesquisa continuam achando que ela é “muito importante” para a sociedade. Apenas pouco mais de 2% dos 15 mil entrevistados responderam que a família não é importante para a sociedade. Isso revela um reconhecimento geral da importância da família e dos valores que ela representa para a pessoa e a sociedade, como também para a religião.

No entanto, também é inegável que, entre os católicos de São Paulo, já não se tem mais uma compreensão unânime sobre o conceito de família. Perguntados se a Igreja deve continuar a propor e a defender a família constituída 
a partir do casamento entre um homem e uma mulher, muitos manifestaram dúvidas. Ainda assim, 77,5% dos entrevistados responderam positivamente. No entanto, 13,6% responderam que tinham dúvidas a esse respeito e 8,8% dos católicos manifestaram que não concordam com a defesa que a Igreja faz do casamento entre um homem e uma mulher.

Esses dados revelam que a pregação da Igreja sobre Matrimônio e família ainda possui forte incidência entre os católicos. Contudo, a questão merece particular atenção na formação e orientação cristã do povo, sobretudo diante do avanço de ideologias que pretendem equiparar outro tipo de convivência, ou união entre pessoas, ao Matrimônio e à família baseados na união entre um homem e uma mulher, conforme ensinamento católico.

A família ainda continua sendo muito relevante quando se trata da vivência da religião e da transmissão da fé. Entre os motivos pelos quais as pessoas continuam firmes na fé católica, 68% dos entrevistados apontaram que isso se deve ao fato de terem nascido e crescido na Igreja Católica. Naturalmente, foi a família quem introduziu os filhos na vida da Igreja e cultivou, de alguma forma, os vínculos com ela e os valores da vida cristã na Igreja Católica. Isso é um fator apreciável, e responde àquilo que a Igreja pede aos casais e às famílias: que os pais cuidem de transmitir a fé aos filhos e os introduzam na vida da comunidade da Igreja.

Em outra pergunta, a grande maioria dos católicos respondeu ser importante que os filhos também continuem sendo católicos e recebam formação católica (98,3%), até mesmo na escola (68,7%). Mesmo assim, 10,6% responderam que não acham importante que os filhos continuem sendo católicos e 31% manifestaram dúvidas ou negaram a importância da formação católica nas escolas. De toda forma, 92% das crianças de famílias católicas já aprenderam a rezar, pelo menos um pouco, em família, e isso é muito apreciável.

O realismo dos números da pesquisa não pode ser desprezado. Quando 85,1% dos católicos dizem que recebem sua formação cristã principalmente pela participação na paróquia e na missa dominical, chama a atenção que apenas um pouco mais de 5% dos católicos participam regularmente da missa e das atividades formativas das paróquias. Outros 25% deles participam esporadicamente da missa, e 70% dos católicos não participam da missa nunca, ou quase nunca. Isso leva à conclusão que não alimentam sua fé, nem recebem formação cristã alguma por meio das formas ordinárias do cultivo da fé da vida cristã. Terão outros caminhos de formação católica? Ou estarão no caminho do completo desligamento da Igreja e da prática da fé?

Isso ainda se faz mais preocupante quando constatamos que uma grande parte das crianças nascidas em lares católicos já não é mais levada ao Batismo e à iniciação à vida cristã. Ou quando nos depararmos com a constatação de que, nos últimos dez anos, os casamentos religiosos registrados nas nossas igrejas tiveram uma queda de mais de 50%! Há muito que agradecer à família o seu papel na vivência e na transmissão da fé. Ao mesmo tempo, é necessário um renovado esforço evangelizador, voltado para a família, por parte da Igreja. E as orientações pastorais dos bispos do Brasil para os próximos anos apontam nessa direção, assim como nosso sínodo arquidiocesano. 

Cardeal Odilo Pedro Scherer
Arcebispo Metropolitano de São Paulo
Publicado em O SÃO PAULO, na edição de 14/08/2019