Assembleia da CNBB: Deus na cidade

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24/04/2019 - 10:45

Como costuma acontecer todos os anos, a assembleia da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) se reunirá na segunda semana da Páscoa. Os trabalhos se estenderão de 1º a 10 de maio, em Aparecida (SP), junto ao Santuário Nacional da Padroeira do Brasil. Além de orações e celebrações em conjunto, encontros fraternos entre os mais de 350 bispos participantes e, também, um dia de recolhimento espiritual, prevê-se uma intensa pauta de trabalhos.

O tema principal será a discussão e definição das Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil para o quadriênio de 2019 a 2023. A assembleia também será eletiva para a escolha dos dirigentes da Conferência para o próximo quadriênio: os membros da Presidência e os Presidentes das 12 Comissões Episcopais Pastorais, que compõem o Conselho Episcopal Pastoral da CNBB.

A definição das Diretrizes Gerais, em assembleia, é uma expressão da comunhão colegial e da corresponsabilidade de todos os bispos, no esforço de enfrentar a questão posta nas Diretrizes. Estas darão os rumos a serem seguidos pelos organismos da própria Conferência em sua missão de animar a pastoral de conjunto da Igreja no Brasil e, também, serão orientadoras para a ação evangelizadora e pastoral das dioceses, que as assumirão e traduzirão de maneira original em suas situações e realidades específicas.

As novas Diretrizes terão, como preocupação central, a presença e ação da Igreja Católica na realidade urbana de nosso País. Atualmente, a população urbana já ultrapassa os 80% da população total do Brasil. A situação está invertida em relação à de um século atrás. Grande parte dessa população urbana vive em metrópoles “multimilionárias”, como São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Belo Horizonte, Brasília, Fortaleza e Manaus. O Brasil já conta com, pelo menos, 16 cidades com mais de 1 milhão de habitantes. E os grandes aglomerados urbanos formaram-se em poucas décadas como consequência, sobretudo, do êxodo rural e da migração de pequenas cidades para os grandes centros

Além disso, há que se considerar que mesmo a população de áreas rurais ou de cidades de pequeno porte absorve a cultura urbana, que promove mudanças de hábitos e de mentalidade nas populações interioranas. A cultura urbana e os novos modos de vida, que ela irradia e até impõe, questionam profundamente a missão da Igreja e os métodos de sua ação evangelizadora e pastoral.

É fato que, influenciadas pela cultura e os modos de vida urbanos, muitas pessoas perderam o contato e sua referência à Igreja Católica. A cidade é o espaço das múltiplas possibilidades de relação e de propostas ocupacionais. É um espaço das liberdades e autonomias, que desafia as pessoas a se organizar de forma nova quanto às suas opções, prioridades e escolhas, inclusive religiosas. E não faltam as mais variadas propostas religiosas na cidade; antes, nos ambientes interioranos, as pessoas viviam sob um controle social mais restrito e, também, sentiam-se mais protegidas e amparadas no cultivo de suas convicções e de sua identidade. Ao contrário, na cidade, suas convicções e sua identidade religiosa católica são mais desafiadas e postas diante de novas possibilidades, inclusive diante da indiferença religiosa e do abandono da religião.

A Igreja Católica não condena a priori a cultura urbana nem combate, simplesmente, o jeito urbano de viver. Ela própria teve sua origem e expansão inicial nas cidades e nelas sempre esteve presente e desempenhou sua missão. O problema não é a cidade, como tal, nem a cultura urbana, na qual também há elementos altamente apreciáveis e tantas possibilidades boas oferecidas à ação evangelizadora. No entanto, é inegável que há questionamentos e desafios inquietantes postos atualmente à missão da Igreja Católica nas cidades. Podemos falar, sem medo de errar, que o futuro da nossa Igreja está nas cidades, e isso deve merecer nossa especial atenção.

Ninguém pode colocar em dúvida que Deus também vive na cidade e ama o povo que nela habita, trabalha, sofre e busca dar sentido à sua vida. A palavra do Evangelho é dirigida às populações urbanas, da mesma forma que às populações rurais. Onde estaria, então, o problema? O que deve a Igreja fazer para ser missionária eficaz do Evangelho na cidade? Eis a questão das novas Diretrizes da CNBB, que também está presente em nosso sínodo arquidiocesano.

Cardeal Odilo Pedro Scherer
Arcebispo Metropolitano de São Paulo
Publicado em O SÃO PAULO, na edição de 24/04/2019