O papel educador da família não pode ser terceirizado

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Cátedra da Família da PUC-SP realizou ciclo de estudos sobre a educação no ambiente familiar, a partir da Exortação Amoris Laetitia, no dia 26
Publicado em: 28/09/2016 - 13:45
Créditos: Fernando Geronazzo e Júlia Cabral/ Fotos:Luciney Martins

Fernando Geronazzo e Júlia Cabral

“Família educando para o amor e a liberdade” foi o tema do 2º Ciclo de Estudos sobre a Família realizado pela Cá- tedra da Família da PUC-SP, na segunda-feira, 26, no Teatro Tuca, em Perdizes. As reflexões partiram da Exortação Apostólica Pós-Sinodal Amoris Laetitia, do Papa Francisco, e foram apresentadas pelo Cardeal Odilo Pedro Scherer, arcebispo de São Paulo e grão-chanceler da PUC-SP, e por Cecília Canalle Fornazieri, doutora em Comunicação e professora da Fatec-Sebrae. Após fazer uma introdução sobre o processo sinodal que resultou no texto da exortação apostólica sobre o amor e a família e explicar a estrutura do documento, Dom Odilo afirmou que a educação na família é tema de grande relevância para a Igreja, não só em relação à formação religiosa. “Nós cremos que a família tem um papel educador fundamental para a pessoa humana na transmissão de valores e referências na vida, contrariamente a uma tendência talvez de terceirização da educação, que hoje existe muito e, talvez, até os pais tendem a se eximir da missão de educadores ou o Estado pretende, muitas vezes, substituir os pais na missão de educar os filhos desde a mais tenra idade”, disse o Arcebispo. 

Correspondência

Para a professora Cecília, o mais interessante do documento é que Francisco não traz nenhuma novidade sobre o tema, mas repropõe valores, como a necessidade de educar para a generosidade, a misericórdia e a paciência. Segundo ela, o Papa também mostra que os valores não são algo externo ao homem, mas correspondentes a ele desde que nasce. Ao destacar o parágrafo 201 da Amoris Laetitia, no qual o Papa fala da importância de a família propor valores que correspondam à sua própria necessidade na sociedade, Cecília explicou o que ela denominou de método da correspondência. “Deus nos dotou de uma experiência elementar, de uma natureza humana. Um conjunto de exigências e evidências com as quais nascemos e que não podem ser removido. É com isso que o ser humano se confronta com a realidade e é capaz de dizer: ‘Não, mas isso não é bom’, ou ‘isso é bom’. É nesse método que confronto aquilo que o meu coração grita e diz se isso é o que corresponde ao meu desejo original ou não”, detalhou. Partindo da sua experiência com a filha de 19 anos e o filho de 15, a professora relatou que, pela correspondência, o medo de lidar com a liberdade dos filhos diminui a partir do momento que se considera que tais valores transmitidos a eles serão levados para sempre. “Por outro lado, é vertiginoso, porque eu gostaria de poder treinar meus filhos para que respondam como eu desejo. Mas não, eles são livres.”

Pais não estão sozinhos

Cecília reforçou que, por mais que o pais tenham cada vez menos tempo para estar com os filhos, é preciso que esse pequeno tempo seja muito verdadeiro. “Se não dá para ficar mais tempo, não dá para outorgar a outro essa função, esse caminho, essa companhia, que é para o resto da vida”, completou, reiterando que a educação dos filhos não pode ser terceirizada de maneira alguma. A especialista reconheceu que esse caminho não é fácil, e, por isso, os pais precisam ter consciência de que não estão sozinhos, contam com a família ampliada, personificada pelos amigos, parentes e pela comunidade. “A gente tem medo. Eu tenho medo. Tenho fé e medo. São os meus amigos que vão também me lembrando das coisas importantes; e os meus pais, meu avô. Se você não tem isso... A Igreja é sempre sábia”, disse. Casados há 33 anos, pais de três filhos e avós de dois netos, o casal Ulisses e Silvia Regina Brandão confirmou essa experiência. “Não estamos sozinhos. Existe, de fato, um método de ver essa correspondência. Isso não é sem dor, não é sem contradições... É a dinâmica da vida... A Igreja, a comunidade cristã, ajudou a sustentar o caminho que fazemos”, disse Silvia. Participante do evento, a professora de Psicologia Maria Amalia Pie Abib Andery, recentemente nomeada reitora da PUC-SP, ressaltou que a família sempre teve o papel de humanizar os indivíduos. “Todos os estudos da chamada psicologia social indicam com absoluta clareza que se fazer humano depende do afeto, de ensinamentos que independem de sistemas formais de ensino. Sem alguém que cuide e cultive os indivíduos, estes não se fazem indivíduos. Desse ponto de vista, nascemos e morremos em família”, afirmou.

(Publicado no Jornal O SÃO PAULO, edição 3121/  28 de setembro a 4 de outubro de 2016)