Ser Igreja à luz de Francisco

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Continuamente, sou surpreendido pelas pregações e ensinamentos do Papa Francisco,diz Dom Edmar
Publicado em: 16/03/2015 - 16:00
Créditos: Edição nº 3042 do Jornal O SÃO PAULO – página 05

Continuamente, sou surpreendido pelas pregações e ensinamentos do Papa Francisco. Ele é, para mim, uma expressão do “Deus das surpresas”… um Deus que nos surpreendeu pela eleição do Cardeal Bergoglio para bispo de Roma, buscando-o no país onde está “o fim do mundo”, Ushuaia, a “cidade mais astral” da Terra. Uma das suas características é utilizar imagens para nos ajudar a gravar seus ensinamentos. Quero, pois, destacar três dessas imagens que ele utilizou para nos falar da Igreja e que nos ajudam a viver esse tempo sagrado da Quaresma.

Uma primeira imagem é a do rio; a Igreja é como um “rio”. Dirigindo-se aos fiéis reunidos para as tradicionais audiências de quarta-feira, no dia 16 de outubro de 2013, o Papa Francisco comparou a Igreja a um rio; ela “corre na história, se desenvolve e irriga”. Mas, assim como o rio tem sua nascente, a “água que escorre” pelo rio que é a Igreja tem em Cristo a sua fonte. Ele, Crucificado-Ressuscitado, “é o Vivente e as suas palavras não passam, porque Ele mesmo não passa, Ele está vivo, hoje Ele está presente aqui no meio de nós, Ele nos ouve, nós falamos com Ele e Ele nos escuta, está no nosso coração”. Desse modo, a Igreja, pela Sagrada Escritura, a doutrina, os sacramentos e o ministério dos pastores, nos oferece a oportunidade de sermos fiéis a Jesus Cristo e de participarmos da vida dele. Penso que o desafio para sermos “Igreja-rio” é não deixar que se acumulem galhos e lixos em nossas curvas, mas manter sempre um fluxo contínuo, deixar sempre correr “a água viva” da salvação que o Senhor nos oferece e quer oferecer ao mundo inteiro, continuamente.

O Papa Francisco nos ofereceu outras duas imagens de Igreja, na sua Mensagem para a Quaresma de 2015: Igreja é como uma “mão" e também como uma “ilha”. Essas duas imagens nas são apresentadas no contexto da luta contra a “globalização da indiferença”. No Projeto divino não há lugar para a indiferença. Deus, que não é indiferente ao mundo, o amou até o extremo de entregar seu Filho para a salvação de cada homem e mulher. O Filho, a quem o Espírito Santo ungiu para evangelizar os pobres, especialmente por seu mistério pascal, abriu “definitivamente a porta entre Deus e o homem, entre o Céu e a terra”. E a Igreja, nascida do seu lado aberto pela lança, é chamada a ser, afirma o Papa Francisco, “mão que mantém aberta esta porta, por meio da proclamação da Palavra, da celebração dos sacramentos, do testemunho da fé que se torna eficaz pelo amor”. Contudo, recorda Francisco, ser “Igreja-mão” é aceitar vir a ser “rejeitada, esmagada e ferida”, pois o mundo “tende a fechar-se em si mesmo e a fechar a referida porta a
través da qual Deus entra no mundo e o mundo n’Ele”. Essa imagem pode inspirar-nos muitíssimo; fazer a experiência de ser “Igreja-mão”, sempre acolhedora, que faz de tudo para nunca deixar que os irmãos e irmãs encontrem uma porta fechada, e, desse modo, continuem na terrível experiência da indiferença.

E uma terceira imagem é aquela da “Igreja-ilha”. Certamente, para muitos, a imagem da ilha é de isolamento, de ficar isolado, de ser isolado e, por isso, no sofrimento da indiferença. Mas não! O Santo Padre convoca as paróquias e cada uma de suas comunidades – expressões concretas da Igreja – a se tornarem “ilhas de misericórdia no meio do mar da indiferença”! Nesse mar, a “Igreja-ilha” é acolhimento, segurança, esperança para quem chega. Contudo, creio que somos chamados também à atitude missionária: sair ao encontro de quem sofre e mostrar-se a eles como “ilha de misericórdia”. Quantas ações organizadas pelas nossas pastorais sociais e numerosas entidades eclesiais, entre as quais a Cáritas Arquidiocesana, revelam esse jeito de ser Igreja! Mas é preciso fazer crescer a consciência de que cada um dos cristãos é chamado a ser misericórdia para os irmãos e irmãs sofredores, com os quais nos encontramos cotidianamente.

Façamos nesta Quaresma de 2015 a bela experiência de conversão, sendo “Igreja-rio”, que faz chegar a salvação ao mundo inteiro; “Igreja-mão”, que jamais fecha a porta a ninguém; e “Igreja-ilha de misericórdia”, que revela o amor de Deus na solidariedade concreta.

Dom Edmar Peron
Bispo Auxiliar da Arquidiocese na Região Belém