Curso de atualização do Clero - Igreja: Casa da iniciação à vida cristã

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08/08/2014 - 00:00
Curso de atualização do Clero - Igreja: Casa da iniciação à vida cristã


O Curso de atualização teológico-pastoral do Clero da Arquidiocese de São Paulo terminou. Para partilhar um pouco do que estudamos, partilho uma síntese do conteúdo exposto pelo Padre Lima, esperando ser fiel ao que ele nos transmitiu.

IGREJA: CASA DA INICIAÇÃO À VIDA CRISTÃ

Neste ano a Arquidiocese de São Paulo tem como urgência pastoral fazer da nossa Igreja Casa da Iniciação à vida cristã (XI Plano Arquidiocesano de Pastoral 80-85).

“É necessário desenvolver, em nossas comunidades, um processo de iniciação à vida cristã que conduza a um encontro pessoal cada vez mais profundo com Jesus Cristo”.

O que é Iniciação à vida cristã?

No que ela consiste? O que fazer para que a paróquia seja casa da iniciação à vida cristã?

“Iniciação” indica o ato de começar, de iniciar algo.

No contexto cristão, iniciação é o processo de admitir uma pessoa como membro da comunidade eclesial. Significa também tornar a pessoa acolhida na Igreja madura na fé e capaz e idônea de celebrar da Sagrada Liturgia. 

Iniciação a vida cristã é, portanto, um processo em que uma pessoa se torna realmente cristã. Para que alguém se torne um “novo homem”, para que possa “nascer de novo”, “nascer do alto”, é preciso um itinerário, um caminho feito de várias etapas.

Esse caminho é formado por diversos elementos: o anúncio da Palavra de Deus, o acolhimento do Evangelho, a conversão pessoal, a profissão de fé, o batismo, a confirmação e a eucaristia. 

Ninguém nasce cristão: torna-se cristão todos os dias e ao longo de toda vida. E ninguém se torna cristão sozinho: torna-se cristão ao ser introduzido na comunidade dos filhos de Deus, ao receber da Igreja a fé professada, celebrada, vivida e rezada.

Eu me torno cristão ao receber a vida cristã que me é transmitida pela Palavra de Deus, pelos sacramentos e pelo testemunho vivo dos outros fiéis de Cristo.

Iniciação à vida cristã é uma ação continuada e prolongada no tempo. Consiste em várias e diferentes ações: anúncio e catequese, diálogo e serviço, presença, testemunho e vida sacramental. Ações essas que apresentam unidade e coerência entre si em vista de um fim que é o de fazer uma pessoa um discípulo missionário de Jesus Cristo.

Fazer da paróquia e da comunidade uma casa da iniciação à vida cristã implica transmitir a Vida plena. Trata-se de uma transmissão vital da sabedoria e da identidade cristãs, da geração de um novo ser e de uma nova Vida em Cristo. 

Não devemos reduzir a iniciação à vida cristã aos cursos de preparação para os sacramentos. Os cursos de preparação são importantes na medida em que eles ajudam as pessoas a se encontrarem com Jesus Cristo, a partilharem a experiência cristã do mistério, a adquirem a capacidade de celebrar atenta, consciente e frutuosamente o mistério cristão.

As etapas da iniciação

A iniciação à vida cristã tem quatro etapas: o pré-catecumenato, a catequese catecumenal, o período de purificação e iluminação e a mistagogia.
As etapas indicam e pressupõem uma progressão rumo à maturidade na fé, uma caminhada feita de crescimento e de passagens, uma educação da fé que vai gradativamente avançando rumo à plena inserção na comunidade da Igreja. 

O pré-catecumenato

A primeira etapa desse itinerário é o pré-catecumenato que consiste no primeiro anúncio. O primeiro anúncio ou querigma é a mensagem central que anuncia a ação e o oferecimento decisivos de Deus de salvar com a morte e a ressurreição de Jesus (cf. Rm 16,25; 1Cor 1,21; 15,3-5). Esse primeiro anúncio já contém o essencial. Podemos até dizer que contém tudo o que a iniciação cristã quer comunicar: ao iniciante é oferecida a salvação em Jesus Cristo de maneira vital e existencialmente significativa.

O ser humano vive à procura de respostas sobre a vida e sobre si mesmo. Pode até ser iludido por turbilhões que escondem essa busca, por fugas que acabam levando a perigos e alienações. Mas as perguntas continuam lá dentro de homens e mulheres que querem saber quem são, por que estão neste mundo, que sentido têm as escolhas que a vida exige de nós (Estudos da CNBB 97,5).

Para que o primeiro anúncio aconteça realmente como oferta da salvação, é preciso que o anunciador esteja atento e identifique as perguntas fundamentais do iniciante interlocutor, as suas inquietudes mais sofridas, a busca incessante de quem deseja se superar.

O querigma, quando feito por cristãos maduros (e não por cristãos com “cara de vinagre”), suscita e responde às perguntas que inquietam o coração humano. É claro que o primeiro anúncio não responde a todas as dificuldades existenciais do ser humano, mas ele refulge com luz suficiente para iniciar uma nova caminhada, para provocar no iniciante uma ascensão, uma subida que promete a plena realização da pessoa e a salvação do mundo. 

Note bem: o querigma não é todo o caminho, mas é seu início. Ou melhor: é mais do que só o início. É o oferecimento de um dom do qual dependem todos os passos a serem dados. É a percepção e a intuição do Mistério da fé que se oferece ao iniciante. A partir da aceitação do querigma, o iniciante pressente claramente que entrará numa caminhada cuja meta ele já vislumbra. Já no início, ao iniciante é oferecida a meta do caminho: Jesus Cristo, a comunhão com Deus, a unidade e a paz com os irmãos e as irmãs. 

O querigma está no início, mas isso não significa que seja só o primeiro passo. Ele é mais do que isso. O primeiro anúncio oferece o vislumbre da meta, o abraço feliz do Pai que nos ama, nos espera e nos deseja. 

O efeito que o querigma se propõe provocar no iniciante é muito bem descrito por Santo Agostinho.

"Tarde te amei, Beleza tão antiga e tão nova, tarde te amei!

Tu estavas dentro de mim, e eu te buscava fora de mim.

Brilhaste e resplandeceste diante de mim, e expulsaste dos meus olhos a cegueira.

Exalaste o teu Espírito, e aspirei o teu perfume, e te desejei.

Saboreei-te, e agora tenho fome e sede de ti.

Tocaste-me, e abrasei-me na tua paz" (Confissões, X,27,38). 

A Catequese catecumenal

A catequese catecumental é a etapa mais longa de todo o processo de iniciação. Durante esse tempo, o catecúmeno vai progressivamente criando familiaridade com a Palavra de Deus, recebe formação catequética, é introduzido nos ritos litúrgicos e se exercita na prática da oração e da vida cristã.

Como se pode notar a catequese catecumenal tem vários elementos que convergem para uma única finalidade que é a de ajudar o catecúmeno a assumir um novo modo de ser.

A catequese catecumenal tem um elemento doutrinal. O catecumenato é o tempo próprio para a catequese doutrinal que se realiza na explicação aprofundada do Símbolo Apostólico, da vida sacramental e litúrgica, dos mandamentos da Lei de Deus e da oração cristã.

É claro que só os conteúdos doutrinários não fazem de uma pessoa um cristão verdadeiro. Mas é verdade também que sem conteúdo doutrinário, a fé arrisca permanecer sentimentalista e intimista. 

A catequese catecumenal é principalmente narração das maravilhas que Deus realizou em favor de seu povo ao longo de toda a história da Salvação. A catequese catecumenal se torna assim catequese bíblica. 

A catequese catecumenal, além de instruir, deve também introduzir o catecúmeno na familiaridade com a Palavra de Deus e com os ritos litúrgicos. A vida cristã, de fato, não é somente doutrina; é sobretudo realidade e mistério. Por isso, a catequese catecumenal tem a finalidade de introduzir o catecúmeno na vida de oração, pessoal, comunitária, litúrgica e ensina-lhe uma nova linguagem.

O senso do mistério, a intimidade com Deus, a oração perseverante e a obediência à Palavra não são capacidades que se adquirem sem iniciação e sem exercício perseverante e cotidiano.

A vida cristã é vida nova em Cristo que inclui comportamentos novos, atitudes concretas e ações renovadas pela Boa Nova. Nesse sentido, o catecumenato é também a etapa em que o catecúmeno deve se exercitar nas virtudes cristãs e em que, progressivamente, ele vai se libertando dos vícios aos quais estava apegado.

Além de ser instruído no conhecimento dos dez mandamentos e das bem-aventuranças, o catecúmeno é auxiliado a colocar em prática a Nova Lei de Jesus Cristo. Assim, aos poucos, o catecúmeno poderá perceber em sua própria vida que viver as virtudes do Reino não é um sonho irrealizável, um ideal inalcançável. Instruído na ética cristã, fortalecido pela vida de oração e pela celebração da liturgia, incentivado pelo exemplo dos fiéis cristãos e, sobretudo, ajudado pela graça, o catecúmeno vai descobrindo aos poucos como a vida cristã exige o combate espiritual e, ao mesmo tempo, que a vida de santidade é uma realidade misteriosa presente na Igreja que o acolhe.


A Purificação e a Iluminação

Depois dessas duas etapas, encerra-se o catecumenato propriamente dito e se dá início ao período da purificação e da iluminação. É nesse momento que o catecúmeno declara diante do bispo ou do seu representante o desejo e a decisão de se tornar cristão. O bispo, então, ouvindo o testemunho dos padrinhos em favor do catecúmeno, acolhe e o declara apto para uma preparação imediata aos sacramentos da iniciação cristã. 

Esse período de purificação e de iluminação é um tempo em que se realça mais o cultivo da vida interior. O Catecúmeno procura purificar seu coração e aprofundar a conversão pelo exame de consciência e pela penitência.

O período de purificação e de iluminação conduz imediatamente à celebração dos sacramentos da iniciação cristã. Assim na noite de páscoa os iniciados recebem os sacramentos do Batismo, da Confirmação e da Eucaristia. Tendo recebido o perdão dos pecados, o iniciado é incorporado ao povo de Deus, torna-se filho adotivo de Deus, é introduzido pelo Espírito na prometida plenitude dos tempos e, pelo sacrifício e refeição eucarística, antegoza o Reino de Deus.

A Mistagogia

Depois da celebração dos sacramentos da iniciação cristã começa a quarta etapa que é o tempo da mistagogia. Esse é o último tempo da iniciação. Nesse tempo, o neófito obtém o conhecimento completo dos mistérios através das explicações e da experiência dos sacramentos recebidos. Na linguagem dos jovens, podemos dizer que mistagogia é o tempo em que “a ficha cai”, ou seja, em que vamos tomando consciência daquilo que já é realidade na nossa vida cristã e requer a nossa aceitação frutuosa.

Conclusão 

Durante este nosso curso, os debates sobre os itinerários evidenciaram dificuldades e desafios para empreender uma catequese de inspiração catecumenal em nossa Arquidiocese e em nossas paróquias. A resistência aos itinerários longos e exigentes de iniciação, o fenômeno da mobilidade (férias e feriados para turismo), a exigência de uma pastoral de conjunto, a importância da família na IVC, a falta de formação dos nossos catequistas são alguns desses desafios. 
Creio que tais dificuldades devem ser enfrentadas com a própria IVC. É a própria IVC a resposta a essas dificuldades.

A iniciação a vida cristã tem como objetivo apresentar às pessoas o que é precioso e que transforma a nossa vida. Deus nos deu algo muito bom, e, através da iniciação cristã, queremos partilhar essa dádiva com outras pessoas. 

A nova evangelização consiste em anunciar Jesus Cristo como o tesouro precioso que recebemos gratuitamente, como a beleza que não passa, como o amor incondicional e fiel de Deus.

De fato, “ser cristão não é uma carga, mas um dom: Deus Pai nos abençoou em Jesus Cristo”. “A alegria do discípulo é antídoto frente a um mundo atemorizado pelo futuro e oprimido pela violência e pelo ódio. A alegria do discípulo não é um sentimento de bem estar egoísta, mas uma certeza que brota da fé, que serena o coração e capacita para anunciar a boa nova do amor de Deus. Conhecer Jesus é o melhor presente que qualquer pessoa pode receber e dar; tê-lo encontroado foi o melhor que ocorreu em nossas vidas, e fazê-lo conhecido com nossa palavra e obras é nossa alegria” (DAp, 29).

 

Dom Julio Endi Alamine