Pessoas chatas

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11/02/2016 - 12:45

Sobre as pessoas chatas, há conselhos deste tipo: “evite as pessoas problemáticas, pessimistas e resmungonas; fuja das pessoas que consomem suas energias, minam as suas relações e só lhe mostram problemas. Em vez dessas pessoas negativas, procure conviver com pessoas que agregam valor a sua vida”.

Esse conselho pode parece bom, mas, na verdade, traz no seu íntimo uma triste falta de caridade e de misericórdia. Nesse sentido, gostaria de refletir sobre uma das obras de misericórdia espiritual: suportar com paciência as pessoas molestas. Por que isso é uma obra de misericórdia?

É uma obra de misericórdia porque a convivência com as pessoas molestas nos obriga a superar nossa tendência de nos concentrarmos somente em nós mesmos. É a nossa preocupação egocêntrica que, muitas vezes, está na raiz de nossa irritação, quando a presença de alguém nos causa sofrimento.

Conviver com pessoas difíceis é como um teste de qualidade do amor: o amor visa sempre o bem do outro acima e antes do próprio bem. Quando convivemos com pessoas simpáticas, o amor é espontâneo, mas pode também não ser amor verdadeiro: amo tal pessoa pelo bem que ela me faz ou porque desejo realmente o seu bem? Mas “se amais somente aqueles que vos amam, que recompensa tereis? Os publicanos não fazem a mesma coisa? E se saudais somente os vossos irmãos, que fazeis de extraordinário? Os pagãos não fazem a mesma coisa?” (Mt 5, 46-47).

A preciosidade dessa obra de misericórdia é o fato de que a paciência em suportar o outro indica a perseverança na caridade. Suporto porque amo, porque quero perseverar no amor e porque, amando, espero o melhor do outro, mesmo que esse outro me seja desagradável.

A paciência hoje é uma virtude que está em falta. Os tempos em que vivemos são acelerados; a vida na megalópole empurra a gente para a impaciência. A gente quer tudo para ontem, tudo tem que ter resultado imediato, sem enrolação! A nossa pressa, que é pressa egocêntrica, nos leva a ver o outro que não corresponde imediatamente às nossas expectativas, desejos, direitos e necessidades como molesto, lerdo, um peso morto que deve ser largado para trás.

Suportar as pessoas molestas é uma exercitação e uma escola para viver a paciência como um modo novo e sapiente de viver neste mundo tão centrado em si mesmo.

A paciência não significa resignação e rendição. A paciência segue o caminho do amor que luta e se esforça pela conversão, pela mudança, pela paz e pela unidade. Paciência é a virtude dos fortes, porque são eles que sabem que o bem, mesmo que demore, sempre vence.

Não nos esqueçamos de que Deus nos suporta com infinita e maravilhosa paciência. Se Deus não tivesse paciência conosco, Ele já nos teria largado para trás; já teria nos abandonado em nosso pecado; já teria desistido de nós e nos entregue ao domínio de Satanás. Deus suporta com ilimitada paciência a nossa preguiça, o nosso relaxo, as nossas obstinações, os nossos erros, a nossa lerdeza pecaminosa. Ele nos suporta com infinitas paciência e misericórdia, esperando que nosso coração, um dia, finalmente se abra ao seu amor de Pai e nos convertamos a Ele.

Sede misericordiosos como o Pai é misericordioso.

Dom Julio Endi Akamine
Bispo auxiliar da Arquidiocese na Região Lapa;
nomeado arcebispo de Sorocaba (SP)

Artigo publicado no Jornal O SÃO PAULO - edição 3088 - 11 a 16 de fevereiro