Caminhos da Iniciação Cristã à luz da ‘Alegria do Evangelho’

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07/05/2014 - 00:00

Em Aparecida, ao final da peregrinação de nossa Arquidiocese, e onde participamos da Assembleia anual da CNBB, dou sequência à reflexão sobre a iniciação como caminho de seguimento de Jesus Cristo, na Igreja. Depois de ter lembrado anteriormente o destaque que a exortação apostólica “A Alegria do Evangelho”, do papa Francisco, dá à Catequese mistagógica, como caminho de formação e de amadurecimento (cf. EG 160 e 166), quero destacar da mesma Exortação mais algumas indicações de caminhos necessários neste processo de formação do discípulo missionário.

A alegria marca a experiência do encontro com o Senhor, desde o primeiro momento, e dura por toda a vida. A iniciação, portanto, coloca a pessoa nesta dinâmica da alegria. O Papa cita várias passagens bíblicas iluminadoras e estimulantes, e ressalta também a alegria que caracteriza a vida das primeiras comunidades: ”por onde passaram os discípulos ‘houve grande alegria’ (At 8, 8); e eles, no meio da perseguição, ‘estavam cheios de alegria’ (At 13, 52). Um eunuco, recém-batizado, ‘seguiu o seu caminho cheio de alegria’ (At 8, 39); e o carcereiro ‘entregou-se, com a família, à alegria de ter acreditado em Deus’ (At 16, 34). Por que não havemos de entrar, também nós, nesta torrente de alegria”, conclui o Papa (EG 5). A vida das primeiras comunidades é iluminadora para a Iniciação Cristã em seus valores fundamentais geradores de alegria: perseverança no ensinamento dos apóstolos, comunhão fraterna, participação na Eucaristia, vida de oração!

O caminho da iniciação passa pelo reconhecimento dos outros, que inclui a abertura para os outros, a fraternidade, a solidariedade, o diálogo, e, particularmente, a vida comunitária, característica marcante do discípulo de Cristo, e que exige rupturas com as tendências fortes de individualismo da cultura atual. Esta é também a dinâmica que leva à missão (Cf. EG 9): “O bem tende sempre a comunicar-se. Toda a experiência autêntica de verdade e de beleza procura, por si mesma, a sua expansão; e qualquer pessoa que viva uma libertação profunda adquire maior sensibilidade face às necessidades dos outros. E, uma vez comunicado, o bem radica-se e desenvolve-se. Por isso, quem deseja viver com dignidade e em plenitude , não tem outro caminho senão reconhecer o outro e buscar o seu bem. Assim, não nos deveriam surpreender frases de São Paulo como estas: ‘O amor de Cristo nos absorve completamente’ (2 Cor 5, 14); ai de mim, se eu não evangelizar!’(1 Cor 9, 16)”.

Lembrando o caminho feito por Abraão e por outros grandes homens e mulheres de fé, o Papa lembra que a fé lança a pessoa e toda a Igreja num caminho de saída, de desinstalação: “Na Palavra de Deus, aparece constantemente este dinamismo de ‘saída‘, que Deus quer provocar nos crentes. Abraão aceitou a chamada para partir rumo a uma nova terra (cf. Gn 12, 1-3). Moisés ouviu a chamada de Deus: ‘Vai; Eu te envio’ (Ex 3, 10), e fez sair o povo para a terra prometida (Cf. Ex 3, 17). A Jeremias disse: ‘ Irás aonde eu te enviar’ (Jr 1, 7). Naquele ‘ide’ de Jesus, estão presentes os cenários e os desafios sempre novos da missão evangelizadora da Igreja, e hoje todos somos chamados a esta nova ‘saída’ missionária. Cada cristão e cada comunidade há de discernir qual é o caminho que o Senhor lhe pede, mas todos somos convidados a aceitar esta chamada: sair da própria comodidade e ter a coragem de alcançar todas as periferias que precisam da luz do Evangelho” (EG 20). A iniciação deve levar a percorrer este caminho, para gerar verdadeiros discípulos missionários.

Para ser geradora de missionários, a Igreja também deve percorrer um caminho de conversão pastoral e missionária. O Papa expressa o seu propósito com a EG e a sua esperança: “Não ignoro que hoje os documentos não suscitam o mesmo interesse que noutras épocas, acabando rapidamente esquecidos”. Apesar disso, sublinho que, aquilo que pretendo deixar expresso aqui, possui um significado programático e tem consequências importantes. Espero que todas as comunidades se esforcem por atuar os meios necessários para avançar no caminho duma conversão pastoral e missionária , que não pode deixar as coisas como estão. Neste momento, não nos serve uma ‘simples administração’. Constituamo-nos em ‘estado permanente de missão’, em todas as regiões da terra (EG 25).
 

Dom Tarcísio Scaramussa, SDB
Bispo Auxiliar de São Paulo
Vigário Episcopal da Região Sé

Artigo publicado originalmente no jornal O São Paulo - ed. n. 3001